A escuridão absorveu a agonia e fiquei sem forças, mas com alivio e gratidão por a memoria ter chegado ao fim . A escuridão tudo levou e eu fiquei livre. Levantei-me da cama e fui para a varanda. Estava aquele vento leve nocturno,e o céu limpo e a lua gigante de uma noite de verão, inspirei uma lufada de ar fresco para readquirir firmeza,conforme era habitual.
Foi então que a cor retrocedeu bruscamente, a memoria ressurgiu e voltou a engolir-me.
"Não!" exclamei em pânico,temendo a dor que aperta o meu coração, bem como o próprio medo.
Todavia, esta não era a mesma memoria. Era uma memoria no interior de uma outra- uma memoria final, como um ultimo fôlego-, de certa forma ainda mais forte que a primeira.
A escuridão da noite tudo levou, menos isto: um rosto.
Este rosto, tê-lo-ia reconhecido entre milhões.
E a memoria do ultimo fôlego antes de sair daquele carro, voltou. A memoria do olhar dele, do sorriso dele, da porta branca a fechar-se , do carro a dar meia volta e ir-se embora, a memoria do silencio que senti e ouvi, na rua onde eu moro, estava naquele momento a presenciar o fim daquilo tudo. Ainda me sentei no passeio e acendi um cigarro, na esperança de conseguir saborear aquele fim, mas não consegui. Era o fim, não podia saboreá-lo e muito menos ignora-lo.
Cada vez que esta memoria me invade a mente, todas as outras memorias que tenho dele aparecem, todos aqueles momentos. Todas aquelas mentiras, minhas.. e dele.
Se não tivéssemos omitido os pequenos detalhes na altura, talvez agora eu estivesse a escrever outras palavras. Se tivéssemos partilhado os pequenos detalhes, havia agora uma grande diferença.
Mas não, há um ano atrás, se soubesse o que sei hoje, tinha feito as coisas de uma maneira completamente diferente.. Também me tinha deixado levar, como ele Tao bem tentou.
Mas nada disto foi possível com as ideias pré-concebidas que tínhamos um do outro.
Com esta historia- que segundo alguns, ainda não acabou- aprendi, que não devemos omitir os sentimentos, que não podemos tentar esconde-los.. muito pelo contrario, temos de gritar ao mundo o que sentimos quando sentimos. Esquecer o medo que temos de dizer ' gosto de ti', 'adoro-te', 'amo-te, por tudo e por nada' ou então ' odeio-te' , 'és insuportável' , 'és impossível', 'já não te posso ouvir, então cala-te'.
Temos de arriscar, temos de parar de pensar nas
consequencias se dissermos ou não o que sentimos, tem de ser um acto natural.. dizê-lo, e pronto.
Acordar a meio da noite, e sentir arrependimento daquilo que não fizemos, é um sentimento tétrico. Não o desejo a ninguém. O sentimento é tão tenebroso que quebra qualquer pensamento racional que tenta infiltra-se dentro da loucura da minha mente.
Já nem sei qual é o meu objectivo nesta historia, todos os dias mudo de ideias tal é a minha instabilidade.
Mas tenho a certeza de uma coisa:
"Olhos que não vêem, coração que não sente", É mentira.